Episódio 13 - «Primeiro Dia» (Joana Estrela)
No primeiro dia de escola, a professora pediu-nos para nos apresentarmos um a um. Dizíamos os nossos nomes, ela escrevia-os no quadro e fazia algumas perguntas. Estava tudo a correr bem até chegar a minha vez.
Ela escreveu Joana com uma caligrafia cursiva muito bonita e perguntou-me onde é que eu morava. Já tinha perguntado o mesmo a todos os outros antes de mim, mas só nesse momento é que me apercebi que não sabia a minha morada.
Comecei por dizer: «É um apartamento...», mas não tinha mais nada a acrescentar e fiquei em silêncio. — Mas onde, querida?
— Aqui... na cidade....
Nenhuma das coisas que podia dizer sobre a minha casa me pareciam muito úteis. Fica num prédio com um quintal onde todos os vizinhos penduram as roupas para secar. Tem um elevador antigo com um espelho rachado. As andorinhas fazem voos rasantes ao pé das nossas janelas, na primavera. Foi então que o Diogo levantou a mão e disse: «Ela mora no Arranha-Céus», e acrescentou, «Eu moro lá também». Nunca antes tinha ouvido a palavra arranha-céus e a primeira imagem que me veio à cabeça foi a de uma construção em forma de unha de gato, a abrir um buraco entre as nuvens. A minha casa não se parecia nada com isso!
Fiquei um bocado aborrecida que o Diogo soubesse dizer onde eu vivo e eu não. E estava determinada a responder bem ao resto das perguntas.
— E o que teus pais, o que é que fazem?
— A minha mãe tem uma loja de perfumes! — Isso eu sabia bem porque passava todas as minhas tardes lá. Os corredores do centro comercial eram ótimos para corridas (é por isso que se chamam corredores!), e às vezes a mãe deixava-me experimentar os testers de perfume em pedacinhos de papel e guardá-los no bolso para cheirar mais tarde.
— E o teu pai, Joana?
Ora bem, o meu pai... eu só o via à noite. Ele voltava para casa com pastas de papéis para ler, assinar e escrever. Disse à professora: «O meu pai lê e escreve muito... eu acho que ele é escritor!»
Ela ficou muito satisfeita. «Ouviram, turma? O pai da Joana é escritor! Oh, que interessante!»
A julgar pela reação dela, eu fiquei muito confiante na minha resposta. Mas mais tarde, quando contei o episódio à minha mãe, ela repreendeu-me por mentir à professora.
Foi nesse dia que descobri que o meu pai era engenheiro civil.
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